Mais uma investigação de grande complexidade está praticamente concluída pela Polícia Civil da Paraíba. Trata-se das mortes de Guilherme Pereira, 18 anos, e Ana Luisa, 17 anos, a princípio informadas como vítimas de acidente de trânsito. Eles estavam em uma moto e colidiriam em um poste. O fato aconteceu no dia 30 de novembro/2024, em João pessoa, e ambos morreram no local.
Só que os dias seguintes foram de novas informações, algumas controvérsias e uma guinada de entendimentos que o vocabulário popular costuma chamar de ‘reviravolta’. Resumimos, abaixo, uma cronologia dos fatos e dois conselhos de amigo.
O local
Quando as equipes do IPC da Polícia Civil chegaram ao local, foram informadas de um acidente. Guilherme teria perdido o controle da moto e batido no poste, após fugir de uma abordagem de policiais militares. Além da versão dada pelos PMs, imagens de uma câmera na área mostram a colisão.
O capacete
O crânio de Guilherme estava ‘estourado’. O estrago na parte frontal do capacete indicava a força do impacto no rosto do rapaz, imagem de face desfigurada bem comum em vítimas de acidentes semelhantes. O equipamento de proteção foi apreendido pela Polícia Civil, como de praxe nas ocorrências do tipo.
O ‘furo’
Dias após o episódio, familiares das vítimas começaram a contestar a versão de ‘acidente’. Um orifício não muito visível (a depender do ponto de vista) alimentou nos parentes do casal a possibilidade de Guilherme ter sido atingido por um tiro. Foi a primeira [nova] informação que começou a mudar os rumos do caso.
O testemunho
No dia do episódio, os policiais militares tentaram parar três motos de uma vez (todas com piloto e garupa). Uma parou na abordagem; outra fugiu pela contramão; e na terceira motocicleta estavam Guilherme e Ana, que também tentaram fugir e acabaram batendo no poste. Assim, não foi apenas o ‘furo no capacete’ que começou a redesenhar o caso. Além do casal morto, outras quatro pessoas estavam na cena. E elas teriam dito – à Polícia Civil e/ou aos pais das vítimas fatais – que “teve tiro na abordagem”. Era a segunda [nova] informação.
Fato novo; delegacia nova
Diante do novo cenário, a Superintendência da PCPB em João Pessoa transferiu o caso da Delegacia de Acidentes para a Delegacia de Crimes contra a Pessoa (DCCPES), que investiga homicídios. E nesta nova fase do processo, exames periciais são requisitados, testemunhas são intimadas, policiais são ouvidos e até a exumação dos corpos é requerida pela PCPB ao Ministério Público e ao Poder Judiciário (sim, somente a justiça é que decide ou não por exumações).
A Polícia Federal
Todos os procedimentos necessários foram requisitados pela DCCPES, inclusive uma parceria técnica com a Polícia Federal para análises periciais no capacete de Guilherme. O orifício de entrada no capacete até que parece visível, mas o de saída é quase de ‘impossível’ percepção imediata, o quão danificado ficou o equipamento. Enquanto isso, na mesa de necropsia do IPC da Polícia Civil paraibana, o crânio de Guilherme teve de ser ‘remontado’. Somente após o reencaixe de mais de dez ‘peças’ cranianas espalhadas é que foi possível visualizar o furo na cabeça.
A conclusão
Depois da nova etapa dessa investigação, a Polícia Civil concluiu que Guilherme foi atingido por um tiro de fuzil na cabeça, quando tentava fugir da ‘blitz’. Com o impacto, ele perdeu a consciência e o controle da moto, vindo a colidir no poste. Ana Luiza não foi atingida pelo disparo, mas morreu em decorrência da colisão. Um policial militar foi apontado como autor do tiro e indiciado por duplo homicídio qualificado.
O conselho I – Não atire em quem foge de blitz
Sim, aqui cabe o jargão mais correto do mundo policial: “cada caso é um caso e só sabe quem está lá”. Fato. Emitir pareceres na zona de conforto é muito fácil. Os filtros que a informação fiel enfrenta no trajeto do cenário real do episódio até chegar aos olhos/ouvidos da população dão margem a muitas interpretações. Mas a vivência nos permite dizer que “atirar em quem foge de blitz [desarmado]” é um risco desnecessário ao policial, que é ser humano e pai\filho de família como qualquer outro cidadão. Ou seja, você, policial, pense primeiro em si.
O conselho II – NÃO FUJA de blitz!
Legalmente falando, o policial indiciado no caso é inocente até que a justiça decida o contrário. E independentemente do veredicto a ele anunciado em breve, NUNCA fuja de uma abordagem da polícia. O episódio em tela (caso confirmado na justiça) não foi o primeiro e – infelizmente – não será o último. Nem a pressão da mídia nem uma possível pena/condenação imposta ao soldado irão evitar que outros casos semelhantes ocorram hoje, amanhã ou depois.
O policial perfeito que se vê em filmes (quando se vê!) não é o da vida real. Este, apesar do treinamento adquirido, também é ser humano, também age por impulso (como quem foge de uma blitz, por exemplo) e também – num dia qualquer, a depender das circunstâncias – poderá apertar o gatilho sem necessidade.
É claro que, quando assim o fizer, ele deve ser punido na forma da lei. Mas se formos todos inteligentes, é melhor o policial na ativa fazendo seu trabalho, e a gente sair vivo de uma abordagem nas ruas.
Blitz não combina nem com tiros nem com fugas.